Após um breve descanso no feriado do carnaval, volto para comentar a matéria da Folha de S.Paulo, publicada ontem, sobre as supostas “resistências” no PSOL à candidatura de Guilherme Boulos. Evito comentar aqui questões internas de nosso partido, mas diante da exposição de nossas divergências internas na imprensa, não me resta alternativa.

Antes de mais nada, informo que o PSOL tem hoje quatro pré-candidaturas inscritas para nossa Conferência Eleitoral e todas elas são legítimas. Assim como é legítima a posição da ampla maioria da direção nacional do partido – incluindo este presidente – e da totalidade da bancada do PSOL na Câmara dos Deputados que trabalham para que Boulos e o MTST formem conosco uma aliança para disputar as eleições de 2018. A decisão será tomada no dia 10, em fórum convocado pelo Congresso Nacional do PSOL, instância máxima de representação da base partidária. Qual o problema da matéria, então? O problema é que ela dá um peso desproporcional a um setor muito minoritário do partido, estabelecido em torno da candidatura de Plínio de Arruda Sampaio Jr. – que defende que não houve golpe no Brasil e que o governo Temer é mera continuidade do governo Dilma – enquanto praticamente ignora o amplo processo de reorganização da esquerda brasileira que se anuncia com a possibilidade de entendimento entre Boulos e o PSOL. Em outras palavras, é uma matéria que busca colocar em dúvida a possibilidade desse acerto, devido a supostas “resistências” no PSOL.

Não penso que a jornalista que fez a matéria tenha agido de má-fé. É mais provável que não tenha resistido à tentação de ressaltar as tendências supostamente “naturais” da esquerda ao fratricídio. Mas não é difícil entender por que uma parte minoritária do PSOL tenha aproveitado a oportunidade da reportagem para repercutir posições que não encontram eco no próprio partido. Para este setor, que curiosamente tem encontrado bastante espaço na grande imprensa, o PSOL nasceu com um único objetivo: ser uma antítese do PT.

Não importa se o PT não governa mais o Brasil. Não importa se há importantes setores no interior do PT que têm expressado seu descontentamento com as tentativas de reeditar alianças regionais com os partidos golpistas. Não importa se ganhamos mais olhando para frente do que para trás. Para essa minoria o papel do PSOL se justifica pela “traição” do PT. Vejo de outra forma. Para mim e todos aqueles que têm apostado no diálogo com o MTST, a Frente Povo Sem Medo, uma parte da intelectualidade crítica, artistas progressistas, enfim, aqueles que apoiam a hipótese de uma candidatura de Guilherme Boulos, o sentido do PSOL é incentivar uma alternativa de futuro para a esquerda e para o Brasil. Ocupamos um lugar singular na política brasileira: somos o único partido de esquerda com representação institucional que não fez parte do campo político liderado pelo PT nos governos Lula e Dilma. O que por muito tempo parecia uma insanidade, hoje mostra-se uma virtude: podemos apontar, com autoridade, os limites daquela experiência e propor uma saída independente dos trabalhadores, trabalhadoras e excluídos. A hora é de radicalidade. Não de esquerdismo senil, esse que sempre cheira um pouco a ressentimento.

O PSOL e a candidatura de Boulos podem fazer muito mais do que ser mera consciência crítica daqueles que apostaram na conciliação de classes como caminho para melhorar o país. Esse papel, a que Plínio e seus apoiadores se propõem, é pequeno demais para quem quer construir uma alternativa de poder dos “de baixo”. A aliança em discussão entre Boulos e o PSOL pode apontar para um novo ciclo na esquerda, cuja marca seria o combate sem tréguas àqueles que promoveram o golpe e hoje destroem as conquistas do povo brasileiro. Esse é o nosso desafio. Até lá, resta perguntarmos: quantas reportagens os grandes veículos de comunicação farão sobre esse tema?