Encontro Sul-americano de Lideranças Emergentes 

CONSTRUIR O FUTURO

“CARTA AO FUTURO”

DECLARAÇÃO FINAL

 

Nas últimas décadas os povos da América do Sul fortaleceram projetos de transformação social, afirmaram sua soberania e ampliaram os processos de democratização, cresceram economicamente e permitiram que milhões de sul-americanos e sul-americanas saíssem da pobreza para ter acesso a direitos sociais e para desenvolver suas expectativas coletivas e individuais. Estes processos se enfrentaram com as forças de restauração neoliberal e conservadora que, inclusive, recorreram muitas vezes a métodos golpistas e violentos, produzindo graves retrocessos.

 

Desde o início do século XXI, o surgimento e o crescimento de novos e dinâmicos movimentos sociais, como os feminismos e as múltiplas diversidades; os estudantis; os ambientais; os movimentos indígenas; os afrodescendentes e as pluralidades étnicas; a economia popular e tantos outros, manifestaram a resistência dos povos latino-americanos e sua vontade de seguir impulsionando a construção de sociedades mais justas e igualitárias.

 

Esses movimentos contribuíram decididamente na construção de novos processos de unidade entre os setores populares dos nossos países e contribuíram para as recentes vitórias eleitorais dos setores democráticos, de esquerda e progressistas.

 

Construir um horizonte político comum é particularmente relevante na América do Sul, uma região que compartilha uma história comum, uma geografia interconectada e desafios semelhantes. Uma região que já tem uma história de tentativas de integração nas quais se apoiar. E também uma dívida enorme de emancipação como uma voz autônoma e potente na arena global. Fica cada vez mais evidente que há desafios que só em conjunto podem ser enfrentados.

 

As dificuldades para a articulação política das esquerdas na América do Sul aprofundam a incerteza gerada pelas enormes mudanças que o mundo atravessa. O fracasso das promessas da globalização ficou evidente na pandemia da Covid-19, particularmente devastadora em nosso continente. A pandemia nos ceifou quase um milhão e meio de vidas num intervalo de tempo de apenas dois anos e nos deixou como sequela um aumento de 3,2% da pobreza. A guerra entre a OTAN e a Rússia agrava a crise energética, alimentar e econômica. A crise climática e ecológica nos desafia a repensar nossos modos de produção e consumo, sem os quais estamos hipotecando a vida das gerações futuras. O recrudescimento da violência, muitas vezes associado aos efeitos do narcotráfico, ameaça solapar a segurança individual e coletiva de nossas sociedades.

 

As novas tecnologias de informação, automatização e fabricação podem ser ferramentas poderosas para enfrentar estes desafios, implementando novos modelos de desenvolvimento ambientalmente sustentáveis para fortalecer a comunicação e o intercâmbio democrático. Por outro lado, também podem ser utilizadas como armas de destruição de nossos bens comuns, de precarização do trabalho e de propagação de discursos de ódio, restringindo ainda mais os espaços democráticos através da concentração da mídia nas mãos de poderes corporativos. 

 

Diante dos evidentes limites da democracia liberal, aumenta o assédio das forças de extrema-direita, golpistas e violentas, que se alimentam precisamente desse ambiente, que se apropriam do senso comum e se conectam com o mal-estar de importantes setores da população, oferecendo saídas simplistas e de curto prazo. Isto desagua numa preocupação cada vez maior para aqueles e aquelas que buscam construir sociedades solidárias, inclusivas, diversas e participativas.

 

Neste cenário complexo, urge repensar as estratégias das esquerdas e seus mecanismos de articulação para construir novos horizontes que convoquem e reúnam os setores populares, que se apoderem das conquistas e, também, que superem os limites das experiências do passado, que encantem nossos povos com uma democracia mais vigorosa e atenta às suas demandas e sonhos, que situem no centro de suas agendas temas, problemáticas, lutas e desafios relegados pelos olhares economicistas da transformação.

 

Este é o desafio que têm os companheiros e companheiras da vida política sul-americana que se incorporam com cada vez mais protagonismo, participação e relevância, assumindo as lutas históricas dos povos, fortalecendo e articulando a diversidade de atores sociais e novas agendas, debatendo com confiança e atuando com criatividade.

 

Por isso anunciamos a criação do FUTURO – Rede Sul-americana de Lideranças Políticas, um espaço que terá como propósito contribuir com os novos discursos e práticas da esquerda sul-americana; fortalecer sua unidade; combater o neoliberalismo e a extrema-direita em todas as suas manifestações; impulsionar um novo modelo de desenvolvimento econômico; defender uma democracia participativa e radical, além de incorporar os novos fenômenos de resistência e mobilização popular à histórica luta para combater todo tipo de desigualdade. Esperamos que esta iniciativa contribua para fortalecer o sonho de uma pátria grande, livre, justa e soberana.

9 de abril de 2023 – Cerro Huelén-Santa Lucía, Santiago de Chile